A vida é um emaranhado de encontros, despedidas e transformações.
Lidamos com diversas formas de perda ao longo da nossa jornada, e cada uma delas nos atravessa de maneira única.
No entanto, há dores que carregam consigo um peso ainda maior, um silêncio que grita e labirintos emocionais que parecem intransponíveis.
Falamos da complexidade do luto quando ele se entrelaça com a incompreensão de uma partida inesperada.
No mês de setembro - mês de conscientização e prevenção ao suicídio, somos convidados a olhar para o tema não apenas sob a perspectiva da prevenção, mas também do acolhimento àqueles que ficam.
Resumo do conteúdo
Quando a Dor Não Tem Roteiro
O luto é um processo natural e humano. Mas e quando a perda acontece por um ato de desespero, por alguém que, em profunda angústia, tirou a própria vida?
Nesses casos, a dor se mistura com perguntas sem respostas, com culpa, raiva, vergonha e um isolamento ainda mais profundo devido ao estigma social.
Afinal, os enlutados, além da saudade e da ausência, são confrontados por sentimentos de falha, de "o que eu poderia ter feito?", de segredos familiares e de julgamentos externos.
A sociedade, muitas vezes, não sabe como reagir a essa perda, e o silêncio que se segue pode ser tão devastador quanto a própria partida.
A Coragem de Sentir e a Importância do Acolhimento

É fundamental quebrar esse ciclo de silêncio. Sentir a dor do outro é um ato de coragem, e permitir-se ser acolhido(a) é o primeiro passo para a cura.
A saúde mental daqueles que vivenciam essa forma de luto precisa de atenção redobrada. Não há um "manual" para lidar com isso, mas há caminhos para aliviar o peso e ressignificar a memória.
"A dor não diminui quando é negada. Ela se cala, mas permanece. É preciso ter a coragem de sentir, de chorar, de gritar, se for preciso, para que a vida possa, aos poucos, se reerguer." — lembra a médica e escritora Ana Claudia Quintana Arantes.
Essa é a essência do cuidado: entender que cada pessoa processa o luto de um jeito e que não há tempo certo para a dor passar. O apoio psicológico, grupos de ajuda mútua e a presença de pessoas que escutam sem julgar são pilares nesse processo.
Segundo a psicóloga e especialista em prevenção do suicídio, Karina Okajima Fukumitsu, escritora de “ Sobreviventes Enlutados Por Suicídio: Cuidados e Intervenções” e criadora da Associação “Se Tem Vida, Tem Jeito” (e um podcast com o mesmo nome), é preciso ter um trabalho de “pósvenção” do suicídio.
Ou seja, um amparo humanizado (e individualizado) àqueles que são impactados com a partida de alguém que tira a própria vida. A estratégia é abrir espaços para que os sentimentos apareçam e não provoquem um efeito de “panela de pressão”.
Ressignificando a Memória
Para os enlutados, o desafio é grande: como lembrar da vida da pessoa amada sem que o último ato ofusque todas as suas qualidades, alegrias e ensinamentos?
É um processo de delicadeza e perdão — muitas vezes, o perdão a si mesmo(a).
- Valide seus sentimentos: É normal sentir raiva, culpa, tristeza, confusão. Mas não se puna por isso.
- Busque compreender, não justificar: O suicídio é um ato complexo, resultante de uma dor psíquica intensa. Não é culpa de quem fica, nem sempre pode ser "entendido" em sua totalidade.
- Fale sobre isso: Procurar um profissional de saúde mental ou um grupo de apoio psicológico especializado em luto por suicídio pode fazer toda a diferença. Compartilhar a experiência e ouvir relatos de quem passou por algo semelhante oferece alívio e compreensão.
- Honre a vida, não a morte: A pessoa que partiu teve uma vida antes do fim. Permita-se lembrar dos momentos bons, das lições, do carinho e de tudo que ela representou para você.
- Cuide de si: O luto exaure. Priorize sua saúde mental e física.
Compreenda que o luto é uma jornada complexa, e em momentos de tamanha fragilidade, o acolhimento e a informação são essenciais.
Ninguém precisa enfrentar a dor sozinho.
Se você está vivenciando essa forma de luto ou conhece alguém que esteja, saiba que existe apoio e esperança.
A ressignificação da memória e a busca por bem-estar são possíveis.
Em casos de urgência ligue 188 (CVV - Centro de Valorização à Vida) ou SAMU-192.